30 January 2008

A IMAGEM NO ESPELHO
(V - uma série exumada a partir daqui)



Acid Mothers Temple & The Melting Paraiso U.F.O. - La Nòvia




The Silver Mt Zion Memorial Orchestra & Tra-la-la Band - Born Into Trouble As The Sparks Fly Upward

O rock "underground" (o que quer que isso queira dizer), hoje, é tão só a imagem reflectida num espelho do seu correspondente "overground". Isto é, tradicionalista, conservador, reaccionário.* E se — numa tentativa possível de delimitação de categorias — se aplicar, por exemplo, a etiqueta "underground" aos grupos que têm livre acesso às páginas da "Wire", alegadamente dedicadas a documentar as "adventures in modern music", então os japoneses Acid Mothers Temple e os canadianos A Silver Mt. Zion adaptam-se perfeitamente à definição. Porque o que uns e outros praticam não é muito mais do que a infinita regurgitação daquilo que, um dia, há já muito tempo, foi inovador mas que, agora, consiste apenas de um interminável e fatigante exercício de "rewind" onde apenas se tropeça nos despojos da memória mais longínqua.



Os Acid Mothers são (e nem sequer o escondem) uma espécie de fóssil oriundo das pedradíssimas trips sonoras dos anos 70, descendentes dos Gong, Hawkwind, Amon Düül e outras luminárias do género, acrescentados da dimensão "mindfuck" dos Blue Cheer ou Black Sabbath. E o enorme problema é que, sendo isso (o que já era um problema suficientemente grande), são só isso. A discografia já é considerável mas, mesmo este La Nòvia — baseado em melodias tradicionais da...Occitânia, dizem eles e nós esforçamo-nos por acreditar — nada mais é do que uma aborrecidíssima sucessão de intermináveis "jams" guitarrosas (no início, com "throat singing" incorporado) para as quais o adjectivo "pointless" foi expressamente inventado.


Os A Silver Mt. Zion (derivação lateral dos Godspeed You Black Emperor!), entretanto, se no anterior He Has Left Us Alone... ainda exibiam um certo espírito de aventura na articulação da música "concreta" com algum minimalismo e sinfonismo, em Born Into Trouble As The Sparks Fly Upward, converteram-se em mero Philip Glass/Steve Reich/Glenn Branca "by numbers". Num panfleto incluído na capa, aplicam-se numa abstrusa teorização pateticamente adolescente sobre "ruined dreams" e demais tragédias perpetradas pelo "sistema". Mas, até isso, já foi feito, mil vezes melhor em incontáveis manifestos anteriores. Consultem, se vos apetecer, e comparem, a Arte de Viver Para A Geração Nova **, de Raoul Vaneigem. É de 1967.

* (começam a ver a lógica da série exumada?)

** (na versão inglesa, The Revolution Of Everyday Life)
(2001)

2 comments:

Anonymous said...

Ouvi um dos Acid Mothers e detestei. Ainda pensei que o problema era meu, de não ser capaz de entender aquele massacre sonoro. Um tédio.

João Lisboa said...

Pois...